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L-Honorato/OBS_Curica

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Observatório Curica

Este é o repositório do Observatório Curica, um projeto desenvolvido pela Promotoria de Defesa da Criança e do Adolescente de Cruzeiro do Sul, do Ministério Público do Estado do Acre (MPAC).

Entre as diversas atribuições do Ministério Público está a defesa dos direitos individuais e sociais fundamentais, consagrados pela Constituição Brasileira. A maneira mais ampla e evidente de efetivação desses direitos se dá por meio da implementação de políticas públicas. O direito à educação e as políticas públicas respectivas é um exemplo de dever de atuação do Ministério Público, por meio das Promotorias de Justiça com atribuição em cada um dos Muncípios brasileiros.

A extensão territorial dos Municípios do Estado do Acre somada à grande e diversa gama de atribuições das Promotorias do interior do Estado impede uma fiscalização in loco de cada uma das escolas da educação básica pública.

Nesse sentido, o Observatório Curica tem por objetivo ser uma ferramenta de apoio às Promotorias de Justiça do MPAC para diagnóstico, avaliação, monitoramento e intervenção em políticas públicas voltadas à educação escolar pública, instrumentalizando-as com informações provenientes de bases de dados oficiais, de modo a identificar violações de direitos e indicar a intervenção possível de maneira eficiente e célere.

Além disso, o Observatório também tem a finalidade de auxiliar o controle social sobre as políticas públicas, contextualizando as informações disponíveis com a realidade da amazônia acreana, populações tradicionais, meio ambiente e crise climática, dando especial atenção à modalidade de ensino "rural", que atende às populações tradicionais indígenas e não indígenas localizadas na amazônia ocidental acreana.

A Curica

Dentro da episteme científica moderna, a curica é uma ave psittaciforme, da família Psittacidae, batizada como Amazona amazonica. Tem o porte um pouco menor que o do papagaio, ressaltando-se o destaque de seus olhos em relação ao seu corpo (WIKIAVES).

Já na cosmologia de povos indígenas da família linguística Pano, habitantes da amazônia sul-ocidental, a jiboia (Yube) é um ser mítico, detentora dos saberes da floresta. Dentro da tradição do povo Huni Kuĩ, Yube é o dono e aquele quem ensina os kene às mulheres, os grafismos que ornam/compõe/potencializam os corpos-objetos. O primeiro kene ensinado pela jiboia às mulheres é o txere beru, o olho da curica, o qual se transforma em outros kene e ganha diferentes sentidos e complexidades (MAIA, 1999).

O nome escolhido para o Observatório, para além de trocadilhos, presta homenagem às populações tradicionais e seus saberes, reconhece a sua luta e procura colocar os nawá kene digitais a serviço da implementação das políticas públicas.

Fontes dos dados

O Observatório prioriza a utilização de fontes de dados abertas e oficiais. Serão utilizados dados do censo escolar, inepdata, programas do fnde, ibge, cadúnico, sigpc, sigpnae, simec e publicações do diário oficial.

Diagrama das ações do Observatório

O diagrama abaixo busca expressar as ações meio e fim que serão executadas dentro do Observatório para diagnóstico e intervenção, bem como para democratização da informação sobre as políticas públicas.

Diagrama

Este diagrama serve também como layout para o futuro website onde as informações serão disponibilizadas ao público.

Coletivo Jibó_IA

O coletivo Jibó_IA é outro projeto desenvolvido dentro da Promotoria que busca subsidiar ações que incrementem a eficência do serviço público prestado pela Promotoria, por meio do desenvolvimento de soluções para automação de processos, elaboração de diagnósticos e monitoramento, fazendo uso dos recursos oferecidos pela ciência de dados e machine learning.

Políticas públicas de interesse

A seleção das políticas públicas educacionais priorizadas pelo Observatório decorre dos problemas mais frequentes trazidos à Promotoria pelas comunidades escolares, tanto das zonas urbanas quanto das zonas rurais/florestais.

Nominalmente referenciados, os problemas selecionados podem parecer similares para todo o Brasil ou, mesmo, para a Amazônia. Entretanto, a análise dos dados e ações subsequentes devem levar em consideração as especialidades socioambientais da amazônia acreana, que apresenta uma diversidade cultural ímpar e uma geografia peculiar que a distingue de outras "amazônias" (ZEE Acre, 2010).

Contextualização

O Estado do Acre possui uma área de 164.221 km², território maior que o da Inglaterra ou quase 7 vezes a área de Israel. Localiza-se na Amazônia Sul-Ocidental, região das nascentes dos rios das bacias hidrográficas do rio Purus e do rio Juruá, afluentes do rio Amazonas. É palco de uma das maiores sociobiodiversidades do planeta. Esse espaço acolhe grandes centros urbanos, unidades de conservação, reservas extrativistas, projetos de assentamento do INCRA, populações tradicionais indígenas e não indígenas (ZEE Acre, 2010).

O deslocamento dessas populações se dá por via terrestre, fluvial ou aérea. Esses meios de transporte são diretamente influenciados pelo clima: no período chuvoso, os rios estão cheios e o transporte fluvial de pessoas e cargas é favorecido. Por outro lado, o transporte terrestre fica prejudicado em razão da precariedade das estradas. Na estação seca, ao contrário, fica favorecido o transporte terrestre e a navegação é afetada. O transporte aéreo é uma alternativa a esses outros, entre centros urbanos.

As políticas públicas educacionais enfrentam esses mesmos desafios logísticos e climáticos, pois estão dispersas e devem ser implementadas em toda essa extensão territorial. Surgem, portanto, dificuldades para a construção de infraestrutura, sanemento básico e disponibilização de água potável, lotação de recursos humanos, fornecimento de alimentação escolar, materiais didáticos e materiais de expediente, transporte escolar de alunos e professores, formações continuadas, acompanhamento pedagógico e gastos com combustível.

Água potável

É interessante pensar que o acesso à água potável em uma das maiores concentrações de água doce do planeta possa ser um problema de saúde pública crônico. Entretanto, essa é a realidade das periferias urbanas da amazônia e das comunidades afastadas dessas cidades. Como explicado acima, o "ensino rural" trabalha com uma grande diversidade socioambiental, onde estão genericamente incluídas os povos indígenas e as comunidades não indígenas ribeirinhas, extrativistas e colonos residentes em projetos de assentamento da reforma agrária.

As escolas da zona urbana são melhores atendidas neste quesito, em comparação com as escolas rurais. Nestas, é muito comum a escola utilizar para o seu abastecimento águas provenientes diretamente dos rios e igarapés ou de poços rasos superficiais, também chamados de "poço amazônico" ou "cacimba". Esta última é a terminologia empregada pelo censo escolar. Essas fontes de abastecimento fornecem água imprópria para o consumo. Ainda, com a chegada da estação seca, dentro de um contexto de crise climática, os rios e igarapés têm tido redução drástica em seu volume de água e as cacimbas secam por completo, deixando as comunidades e escolas em situação de crise hídrica.

Muitas vezes, endereçar o problema de fornecimento de água potável de uma escola acaba por atender toda a comunidade de seu entorno. Esta é uma política pública de grande impacto social.

Nesse rumo, o FNDE disponibiliza o "Programa dinheiro direto na escola" - PDDE Água, que destina recursos financeiros para "garantir o abastecimento de água em condições próprias para o consumo" (Resolução FNDE nº 2/2021). Para receber o recurso, a unidade escolar deve:

  • declarar no censo escolar a inexistência de abastecimento de água potável;
  • funcionar em prédio próprio;
  • possuir Unidade Executora própria (UEx);
  • não ter sido beneficiada anteriormente;
  • elaborar termo de compromisso.

Na prática, as escolas rurais acabam por enfrentar dois impedimentos principais para acessar tal recurso:

O primeiro deles é o erro no preenchimento da condição do fornecimento de água potável no censo escolar. A análise dos dados do censo escolar demonstra que muitas escolas anotam a condição de água potável a fontes de abastecimento que são impróprias para o consumo, como as cacimbas. Dentro de uma generalização, é possível afirmar que a qualidade da água das cacimbas é melhor que a dos rios e igarapés. Entretanto, não atende os requisitos de potabilidade da Portaria 888/2021 do Ministério da Saúde.

Para a identificação do problema do preenchimento incorreto do censo escolar, basta listar as escolas que declaram possuir água potável cujas fontes de abastecimento são os rios, igarapés ou cacimbas. Detectado o erro de preenchimento, a Promotoria deve intervir junto à respectiva Secretaria de Educação para corrigir o problema para habilitar a UEx a receber os recursos no ano subsequente.

O segundo impedimento é a ausência de unidade executora própria (UEx). Tanto a gestão estadual quanto as municipais recorrem à solução administrativa de criação de "escolas polo" na educação rural indígena e não indígena. As respectivas Secretarias de Educação criam "escolas anexas" a essas escolas polo, somando o número de alunos e servidores desses anexos às escolas polo. Nesta agregação, as escolas anexas não são contabilizadas no censo escolar e não conseguem acessar os recursos do PDDE água, pois não se constituem em UEx. Somente a escola polo é contabilizada no censo e acaba por acessar este recurso. As demais escolas anexas ficam desatendidas e não é possível identificar esta situação pelo censo escolar, de modo que esses dados não refletem a realidade, violando o direito dos alunos de acesso à água potável.

Para atacar este problema é possível utilizar a base de dados do INEP, que possui o cadastro de todas as escolas da rede de ensino alvo, tanto escolas polo como escolas anexas. Assim, o cruzamento da base de dados do censo escolar com a base de dados do INEP Data permite saber com precisão o número de escolas anexas que existem na zona rural. De posse dos dados, a Promotoria pode intervir junto à respectiva Secretaria de Educação para a criação da UEx daquela unidade escolar e habilita-la a receber os recursos do PDDE água. A outra alternativa é o ajuizamento de Ação Civil Pública, demandando o ente para efetivar o fornecimento da água potável com recursos próprios.

Infraestrutura

Em razão da proximidade, as escolas da zona urbana possuem fácil acesso aos serviços da Promotoria e podem ser rapidamente inspecionadas. Ainda, o controle social é muito mais intenso, favorecendo a qualidade da estrutura física. Por outro lado, as escolas rurais indígenas e não indígenas são distantes da sede da Promotoria, dificultando a fiscalização in loco. Os problemas relacionados à falta de infraestrutura abrangem a ausência total de qualquer infraestrutura, tais como escolas que funcionam em galpões adaptados, na casa do professor ou em cupixaus ou "chapéus de palha" com piso de chão batido. Outro problema frequente nas escolas rurais indígenas e não indígenas é a presença de prédio com salas insuficientes para atender o número de turmas, com aulas sendo ministradas nos refeitórios e corredores, bem como ausência de cozinha, banheiros, sala administrativa, biblioteca, etc.

Em sua responsabilidade complementar, no quesito infraestrutura, o FNDE disponibiliza o recurso "PDDE Campo", "... a fim de propiciar adequação e benfeitoria na infraestrutura física das unidades escolares beneficiadas." (Resolução FNDE nº 5/2021). Mesmo escolas que já tenham recebido o recurso em anos anteriores podem participar do programa. Os requisitos para adesão pelas escolas são:

  • declarar-se no censo escolar como uma escola ativa e com matrículas;
  • funcionar em prédio próprio;
  • possuir Unidade Executora própria (UEx);
  • não ter sido beneficiada anteriormente;
  • elaborar termo de compromisso.

Tal qual o PDDE Água, o arranjo administrativo que cria escolas anexas à escola polo atua como impeditivo ao acesso aos recursos do PDDE Campo, pois os anexos não possuem UEx própria. Mais grave, as informações do censo escolar acabam contemplando somente a escola polo, que agrega todos os alunos da região e o recurso só pode ser executado em melhorias que atendam exclusivamente a UEx beneficiada. Ainda, os dados do censo escolar a respeito da infraestrutura dos prédios escolares se refere somente às escolas polo. As condições da infraestrutura das escolas anexas são invisibilizadas e são as que, justamente, possuem condições mais precárias.

Mais uma vez, o diagnóstico só é possível com o cruzamento dos dados do censo escolar e a base de dados do INEP. Esse filtro enumera a quantidade de escolas anexas que devem ser inspecionadas. Outro indicador interessante é verificar o número de salas declarado no censo escolar pela escola polo. Então, basta dividir o número total de alunos declarados no censo como matriculados na escola polo pelo número de salas de ensino disponíveis. Então, deve-se aplicar um filtro para selecionar os resultados maiores que o limite máximo de alunos por turma e modalidade de ensino, defindido pelo Conselho Estadual de Educação (Instrução Normativa CEE nº 347/2023). A discrepância fica evidente.

Esse filtro permite direcionar os esforços das Promotorias com precisão, incrementando-se a eficiência da intervenção. Mais uma vez, a Promotoria pode intervir junto à respectiva Secretaria de Educação para a criação da UEx daquela unidade escolar e habilita-la a receber os recursos do PDDE Campo. A outra alternativa é o ajuizamento de Ação Civil Pública, demandando o ente judicialmente para compeli-lo à construção das benfeitorias necessárias com recursos financeiros próprios.

Recursos Humanos

Por óbvio, não basta a construção de infraestrutura para que o direito à educação seja efetivado. Os recursos humanos são essenciais para uma educação de qualidade. De largada, é possível classificar a demanda de recursos humanos de uma escola em corpo docente e corpo técnico-administrativo, como auxiliares de serviços gerais ou servente e manipuladoras de alimentos, as celebradas merendeiras. A título de exemplo, a Instrução Normativa nº 02/2021, da Secretaria Estadual de Educação do Acre, estabelece diretrizes administrativas para a Lotação de Servidores e dispõe sobre a composição do corpo administrativo educacional, além de definir as atribuições de cada colaborador. O número mínimo definido para contratação desses colaboradores, por escola, é de um servente a cada duas salas de aula e de uma merendeira a cada 100 alunos, por turno.

A exemplo das dificuldades anteriores, as escolas da zona urbana costumam contar com o quadro de docentes e de corpo técnico completos. A insistência no desfalque é rapidamente comunicada à imprensa, redes sociais ou à Promotoria para providências. Ao contrário, o desfalque de servidores nas escolas rurais indígenas e não indígenas é um problema crônico. É frequente que tais escolas contem apenas com professores em seu quadro de servidores. Nesses casos, a limpeza do ambiente escolar e o preparo da alimentação ficam a cargo desses professores ou, em situações extremas, esse trabalho é realizado pelos próprios alunos. O fato é que o ensino fica prejudicado, pois o professor tira tempo de sala de aula para a realização dessas tarefas, diminuindo a carga horária letiva mínima a qual os alunos têm direito.

Novamente, essa situação não pode ser constatada somente com os dados do censo escolar, em razão do agrupamento dos alunos em escolas polo. Entretanto, é possível criar filtros com indicadores baseados nas constatações de campo e cruzar esses dados com a do Inep para identificar as escolas anexas e comparar os somatórios de servidores com as quantidades mínimas da Instrução Normativa citada acima. Essas análises trazem eficiência para o diagnóstico e permitem uma ação precisa e eficiente das Promotorias do interior do Estado. No caso de contratação de recursos humanos, a propositura de Ações Civis Públicas têm sido o meio mais eficiente para compelir Estado e Municípios a contratar o mínimo de servidores necessários para execução do serviço público.

Alimentação escolar

A disponibilização de alimentação nas escolas é uma política pública de combate à fome que teve início por volta do ano de 1930, com a prevalência de doações de instituições internacionais de combate à fome ao governo brasileiro. Somente na década de 1970 é que o governo brasileiro passou a priorizar a aquisição de gêneros alimentícios de fabricantes nacionais. Em 1979 é criado o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) com esta denominação. Na época, a logística era centralizada, com prevalência na aquisição de alimentos enlatados (ultraprocessados) que eram distribuídos para todo o território nacional (Peixinho, 2013). Por sua vez, a Constituição brasileira de 1988 eleva a alimentação escolar a direito fundamental (Art. 208, inc. VII)).

Nessa esteira, o direito à alimentação escolar no ensino público está previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) como responsabilidade do sistema respectivo de ensino, estadual ou municipal. A União tem papel de colaboração e de complementação nesta política e, para tal, lança mão do PNAE. Trata-se de uma política pública que repassa recursos federais diretamente para a rede pública de ensino estadual e municipal para aquisição de alimentação escolar e é regulamentada pela Lei 11.947/2009 e pela Resolução FNDE nº 06/2020.

Embora ele esteja dentro da estrutura administrativa educacional, o programa também integra o Sistema Nacional de Segurança Alimentar (Lei 11.346/2009) e a Política Nacional da Agricultura Familiar (Lei 11.326/2006). Especialmente com relação à agricultura familiar, a lei 11.947/2009 estabelece que, do total dos recursos repassados pelo PNAE, no mínimo 30% devem ser utilizados na aquisição de gêneros alimentícios provenientes da agricultura familiar. Além dos recursos provenientes do PNAE, também é dever de Estados e Municípios arcarem com a contrapartida financeira necessária para implementação da política de alimentação escolar das respectivas redes de ensino.

Paradoxalmente, o quadro de oposição entre a realidade urbana e rural se repete também na alimentação escolar. A grande sociobiodiversidade que se encontra no Estado do Acre abrange também as práticas agrícolas e extrativistas das populações tradicionais. Entretanto, tal diversidade não se reflete na composição dos cardápios da alimentação escolar. Sob a justificativa de dificuldade logística, prevalece a prática de centralização da aquisição de produtos industrializados e distribuição de enlatados da década de 30 (CGU, 2024), desatendendo os mínimos nutricionais estabelecidos pelo art. 18 da Resolução FNDE nº 06/2020.

A solução lógica para a melhoria da alimentação escolar urbana e rural é a implementação da aquisição dos alimentos da agricultura familiar e promoção da descentralização logística, comprando alimentos dos agricultores próximos das escolas. Toda a moldura burocrática já foi contemplada pelo FNDE, permitindo-se o arranjo. Implementada, esta política tem o potencial de impactar positivamente tanto a qualidade global da alimentação escolar como, também, as famílias agricultoras envolvidas no processo.

Neste caso, o monitoramento se dá com os dados da plataforma SigPC, verificando-se os valores destinados à aquisição de alimentos da agricultura familiar, bem como o quantitativo de compras diretas de fornecedores individuais. Diante da complexidade da execução desta política pública, a melhor intervenção da Promotoria se dá na facilitação da articulação entre os diferentes atores envolvidos.

Transporte escolar

Como insistentemente explicado acima, relembra-se que o Estado do Acre possui vasta extensão territorial, espaço onde se desenrola a política pública educacional. Além disso, deve-se levar em conta a diversidade geográfica onde o transporte escolar deve ser ofertado. De modo genérico, é possível iniciar a discussão contando três contextos diferentes: a zona urbana, a zona rural terrestre e a zona rural ribeirinha. O transporte escolar da zona urbana é facilitado pelo adensamento populacional e infraestrutura urbana disponível, como a presença de veículos e ruas pavimentadas, de regra. O transporte escolar da zona rural terrestre é, com maior frequência, realizado em estradas sem pavimentação que se deterioram rapidamente no período chuvoso. Por sua vez, o transporte escolar fluvial atende as escolas ribeirinhas e é prejudicado durante a estação seca, situação agravada no presente em razão da crise climática.

A zona urbana possui uma melhor distribuição espacial de escolas e atende a maior parte da demanda do ensino fundamental. As escolas de ensino médio são em menor número e necessitam de um apoio maior do transporte escolar. Como se verá adiante, a evasão escolar é mais intensa no ensino médio e é preciso investigar se a deficiência de transporte escolar pode ser mais uma causa para o abandono dos estudos.

Na zona rural, a necessidade de transporte é a regra. À exceção daqueles alunos que residem nas comunidades ou aldeias que abrigam escolas, os alunos não residem próximos do local de ensino e necessitam do transporte escolar, tanto na zona terrestre como na ribeirinha. Relembre-se que a maioria das escolas se encontra na zona rural.

A constituição de 1988 também coloca o transporte escolar como parte do direito à educação em sentido amplo, (Art. 208, inc. VII)). A (LDB), por sua vez, determina que o transporte escolar é responsabilidade do respectivo sistema de ensino, estadual ou municipal. Para auxiliar Estados e Municípios, o FNDE executa o Programa Nacional de Apoio ao Transporte do Escolar (PNATE), "(...) com o objetivo de oferecer transporte escolar aos alunos da educação básica pública, residentes em área rural (...)" (Lei 10.880/2004). O valor do repasse é calculado com base no número de alunos que estudam na zona rural que utilizam transporte escolar, assim declarados no censo escolar do ano anterior.

Para receber o repasse, basta a anotação no censo escolar de que o aluno utiliza o transporte escolar. A transferência é automática. Entretanto, para atender a legislação, Estados ou Municípios devem primeiro disponibilizar o serviço, para então fazer a anotação no censo escolar e receber a suplementação (Resolução FNDE nº 18/2021.

No ensino da zona rural, enfrenta-se o mesmo problema de agrupamento dos dados do censo escolar das escolas anexas aos dados da escola polo. Entretanto, diante da realidade das dificuldades logísticas já conhecidas e da grande demanda constatada em campo, é possível a criação de um filtro arbitrário para definir a deficiência na prestação do transporte escolar na zona rural. Se houver anotação no censo escolar de que menos de 80% dos alunos matriculados em determinada escola fazem uso do transporte escolar, a situação deve ser apurada. O levantamento deste dado permite, mais uma vez, uma ação precisa das Promotorias de Justiça no endereçamento da demanda. Basta o cruzamento dos dados do censo escolar, Inep e a requisição das rotas de transporte escolar terrestres e fluviais. Na impossibilidade de solução extrajudicial, o Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência consolidada que estabelece como critério de razoabilidade a obrigatoriedade de oferta de transporte escolar pelo respectivo sistema de ensino para alunos que residem a mais de 2 quilômetros de distância da escola.

Evasão Escolar

A identificação das causas da evasão escolar é uma ação mais complexa e necessita de diferentes abordagens de acordo com a etapa de ensino e sua localização. O panorama global é facilmente identificado com os dados de matrícula, por série, no censo escolar. Entretanto, há a possibilidade de cruzamento das diferentes variáveis contidas no censo escolar para o fim de identificar falhas de infraestrutura, transporte e recursos humanos que contribuem para o quadro de evasão escolar.

Outra estratégia é utilizar os dados de acesso restrito do censo escolar para verificar se determinado aluno solicitou sua transferência e não se matriculou novamente. Essa abordagem permite uma atuação pontual, caso a caso.

Metas do Plano Nacional de Educação - PNE

O art. 214 da Constituição Federal determinou a elaboração do Plano Nacional de Educação (PNE), com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas. Ele foi instituído pela Lei 13.005/2014, com vigência de dez anos.

A legislação determina que o PNE estabeleça metas e implemente seu monitoramento com base nos dados do censo escolar mais atualizado, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD e o Censo Demográfico do IBGE. Para tanto, o Ministério da Educação e Cultura (MEC) disponibiliza a plataforma PNE em Movimento, onde disponibiliza os dados. O detalhamento do acompanhamento das metas chega a nível de Município, utilizando os dados da PNAD Contínua Situação das Metas. Sem dúvida, é uma métrica válida como indicador. Entretanto, ela é vaga e não aponta um caminho de ação para as Promotorias de Justiça. Para tanto, há a necessidade do emprego de outras métricas para uma quantificação mais precisa da performance de dada meta.

As metas selecionadas para monitoramento imediato são:

  • meta 01: Educação Infantil

  • meta 02: Ensino Fundamental

  • meta 03: Ensino Médio

  • meta 04: Inclusão, Ensino Especial

  • meta 05: Alfabetização Infantil

  • meta 06: Educação Integral

  • meta 15: Profissionais da Educação, formação

  • meta 16: Formação, pós-graduação

Mapa

A disponibilização da localização exata das escolas facilita o planejamento e execução de toda a política pública educacional. Por sua vez, o INEP exige o preenchimento das coordenadas geográficas das escolas no censo escolar para acesso a determinados recursos. Dada a grande extensão territorial do Estado do Acre e de seus Municípios, a plotagem da localização das escolas em um mapa auxilia na compreensão da dimensão do desafio e facilita o monitoramento da execução das políticas públicas.

Entretanto, é possível observar nos dados do INEP que existem muitas escolas que não preencheram os campos de latitude e longitude exigidos. De plano, a primeira ação das Promotorias deve ser a intervenção junto às gestões educacionais, para que preencham os dados corretamente. O próximo passo é a plotagem das escolas em um mapa, fazendo uso das coordenadas geográficas.

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